Um gesto quotidiano – atravessar uma rua – como reactivação do olhar.
Por força da repetição, as acções quotidianas tendem a tornar-se neutras. Olhamos sem ver, passamos sem reparar. Perde-se a consciência específica dos espaços e, com ela, a riqueza perceptiva e sensorial do contacto com o mundo.
Ao introduzir nesta realidade um elemento que lhe é estranho, e mesmo não alterando as propriedades do espaço em si, estimula-se a reactivação da sua percepção e devolve-se à experiência o seu valor. Através deste olhar activo, o sujeito – enquanto indivíduo e enquanto colectivo – torna-se parte integrante do espaço, a sua presença torna-se consequente.
Ao transpor a escora do seu carácter utilitário para o plano artístico-arquitectónico – interventivo – e salvaguardando a sua natureza de elemento de sustentação, amparo, firmeza e resistência, esta instalação toma forma na cobertura de uma rua – a escora abdica do seu valor unitário para funcionar como estrutura contínua.
Dá-se, assim, destaque a locais com pouco impacto na estrutura urbana do centro histórico de Torres Vedras – neste caso, a Rua de Trás do Açougue –, inserindo-os nos circuitos dos seus habitantes e oferendo-lhes uma experiência diferenciada. Por outro lado, a existência neste local de edifícios devolutos e fachadas degradadas potencia a pertinência do elemento proposto, que evidencia esta realidade esquecida.
Da transição de escalas – pela redução de altura ao longo da rua, acompanhada de um aumento de densidade – resulta um crescendo de tensão e compressão do espaço e, da sombra desta estrutura – que duplica o seu ritmo – uma distinta relação com o chão. Dessa forma, produzem-se novos efeitos no transeunte, incentivando-o a repensar a sua relação com os espaços de todos os dias.
A instalação ESCORA integrou o Festival Internacional de Arte no Espaço Público CICLO 2014, a decorrer no centro histórico de Torres Vedras, ocupando a Rua de Trás do Açougue de 8 a 11 de Outubro 2014.
Agradecimentos:
Belgas Constrói Lda.
TUP - Teatro Universitário do Porto